“Quem de vocês nunca sentiu uma pontada súbita ao reviver uma velha experiência ou ao sentir uma emoção antiga? ‘Isso já me aconteceu antes…’ Por que essas palavras nos tocam sempre tão profundamente?”
Assim se inicia o primeiro capítulo deste livro e ao lê-lo me percebi de novo imersa no que a autora com suas tantas obras conseguiu em outros momentos de minha vida: além de seguir os diálogos e situações do enredo, me indagar sobre a alma humana. Agatha Christie não traz muita descrição de ambientes, o forte em sua escrita são os diálogos e as caracterizações dos personagens. Hercule Poirot e Miss Marple, os detetives mais famosos da escritora, pareciam tão próximos a mim, seja a excentricidade do belga de bigode exagerado, como a aparência comum de senhorinha de interior. Os envolvidos nas tramas são vasculhados, as entrelinhas nos levam a buscar a verdade intrínseca a cada um. E isto para mim é o mais belo na sua forma peculiar de criar um suspense: a habilidade de nos conduzir ao cerne do ser humano.
Há momentos em que só queremos adivinhar qual o assassino em Cai o pano. Saber que Poirot já descobriu o culpado e não nos diz, pois estamos lendo sob a ótica do narrador Hastings, seu amigo de longa data, nos navega em uma narrativa diferente. Porque somos conduzidos nas impressões de Hastings e também enganados por elas, pois os caminhos da mente deste não são tão geniais quanto os do fantástico detetive. Por exemplo, neste trecho “ Você fica preocupado em acertar de qualquer jeito a identidade de X. Não foi para isso que convidei você para vir aqui. Não é preciso que você se ocupe disso aqui. Isso eu sei. Mas o que eu não sei e que eu tenho que saber é: ‘Quem vai morrer aqui, e logo?’ Essa é a questão, temos de impedir a morte de um ser humano”. Aqui, a crítica também nos atinge. A pergunta certa deve ser feita. É como se ele nos dissesse, pare de perder tempo questionando o que você não precisa saber, nós nunca saberemos de tudo, concentre-se em fazer o que somente você pode construir.
Gostei muito desta parte e vou deixá-la para reverberar em você: “Alguma coisa na sua voz novamente me causou aquele pavor vago, ainda desconhecido na sua essência, que já havia sentido umas duas ou três vezes. Era como se em algum lugar, bem perto, estivesse uma coisa que eu não queria ver, que não suportaria reconhecer. Alguma coisa que, bem lá no fundo, eu já sabia…”
Um beijo,
Magda Medeiros