A casa das setes mulheres- Leticia Wierzchowski

“— Não são cosas boas, Manuela. Mas também não são cosas más. Vosmecê vai entender o que le digo, depois de ler a carta… São cosas desta vida, Manuela.”

Frases como estas mostram o que ronda todo o romance, a sensação de inevitabilidade com que as mulheres daquela época lidavam com o dia a dia, transmitida pelas matriarcas às mais jovens. Esposa, filha, irmãs e sobrinhas de Bento Gonçalves, uma figura central da revolta, saíram de suas vidas na sociedade riograndense e se entocaram na estância para aguardar os acontecimentos da Revolução Farroupilha, no período de 1835 a 1845. O que esperavam de conclusão rápida, vai se estendendo. “Sabe que dia é hoje, mãe? Faz um ano que a revolução começou. D. Ana olhou as mãos caídas sobre o colo, lívidas. Fazia um ano. Um ano inteiro de ansiedades e esperas. A gente aprende a não sentir o tempo, meu filho. Senão, acaba enlouquecendo”.

O cotidiano das sete mulheres, moldadas pelo seu tempo, em vários momentos me gerou inquietude, pasmo, indignação, na forma como descrevia assuntos como escravidão, papel da mulher, traição, casamento. Algumas personagens são mais aprofundadas, outras um pouco rasas, porém o livro faz um retrato das relações familiares com bastante credibilidade para o espaço/tempo escolhido.

O livro foi construído com narrador misto, uma parte a protagonista, Manuela, escreve em primeira pessoa nos seus cadernos, intercalada com capítulos de contação dos fatos em terceira pessoa. Manuela não foi a minha personagem favorita, talvez por suas escolhas não serem as que eu desejaria para ela, apesar de serem condizentes com a forma como a autora conduziu a história bem como com a pessoa real em quem foi inspirada. D. Antônia, por outro lado, além de trazer consigo a força, a serenidade e a sabedoria, também nos mostra que o amor vai além das regras e o pertencimento nasce de olhar o outro com compaixão.

O meu trecho predileto foi esse: “Do mesmo sonho que se vivia, também se podia morrer, ocorreu-me isto naquela noite, num susto, como um pássaro negro que pousa numa janela, trazendo sua inocência e seus agouros. Muitas outras vezes, nos longos anos que se seguiram, tive oportunidade de me recordar dessa estranha frase que ouvi outra vez, algum tempo mais tarde, na voz adorada de meu Giuseppe, e que repetia o que eu mesma já tinha dito ao ver uma fresta do futuro… Talvez tenha sido exatamente nessa noite que tudo começou”.

Do mesmo sonho que se vivia, também se podia morrer.

E também poderia se ajustar as velas, mudar a rota sem perder o horizonte.

O que aconteceria se Manuela tivesse tomado outro caminho? Às vezes, um desvio basta para mudar tudo: é um desfecho que eu almejaria para ela. Apesar da realidade e do seu tempo.

Beijos,

Magda Medeiros

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